segunda-feira, 10 de setembro de 2007

O poeta inventado


Amadeu de Souza Prado. Este é o nome de um poeta português a partir do qual se constrói a história do romance "Nachtzug nach Lissabon" (Comboio nocturno para Lisboa), do suiço Peter Bieri, que escreve sob o pseudónimo Pascal Mercier.

Não li nada sobre este romance na imprensa portuguesa, o que é natural, uma vez que este foi publicado em 2005 na Alemanha, país onde o escritor é professor na Freie Universität de Berlim. No entanto, toda a história se concentra na descoberta de um professor suiço da cultura portuguesa, a partir de um encontro casual com uma mulher num dia de chuva em Berna, sua cidade natal. A anónima encontra-se numa situação algo incómoda; ao telefone, cheia de livros na mão, tenta apontar um número que alguém do outro lado da linha lhe está a dizer. Gregorius (o professor suiço) ajuda-a, e acaba por levá-la para a escola onde lecciona. Ao reconhecer pelo seu sotaque que a sua língua mãe não é o francês, pergunta-lhe qual o seu idioma, ao que a mulher responde "português", em português. A sonoridade desta palavra despoleta um estranho e curioso interesse de Gregorius pela língua da mulher (que misteriosamente desaparece), e é isto que o leva à descoberta de um livro em português de um tal Amadeu de Prado, cuja leitura leva o professor a aprender português de modo autodidacta e a abandonar repentinamente a cidade onde descobriu que tinha uma vida de que não gostava. Gregorius parte para Portugal, descobrindo a história e a vida pessoal de Amadeu de Prado,e envolvendo-se nela, e com as pessoas que a ela sobreviveram.

O romance é longo e inesperadamente detalhado no que diz respeito aos lugares (Lisboa, Coimbra, Almada, Esposende, Viana do Castelo, Galiza, Salamanca). Há claramente uma tentativa do autor de descrever estes lugares apenas como cenário da acção, e não como descrição exacerbada dos costumes e pessoas destes lugares, o que concentra a narração somente na personagem de Gregorius e na sua busca de pessoas relacionadas com Amadeu.

O que mais surpreende é a suposta transcrição de extractos completos do livro de Amadeu que Gregorius tem na mão dia e noite, e que vai traduzindo, e que não só consiste em reflexões sobre o sentido da vida e da morte, como provoca uma vontade imensa de ler os escritos reais de Amadeu, que apesar de tão verosímeis no romance, acabamos por descobrir que não existem, nem o próprio poeta.

Uma tradução da obra vencedora do prémio literário Marie Louise Kaschnitz, em 2006, para língua portuguesa seria interessante. Para já, a todos aqueles que se dão bem com a língua alemã aconselho vivamente a leitura.

2 comentários:

The Perfect Drug disse...

Podias aventurar-te e traduzi-la tu :)

André disse...

Infelizmente, a edição portuguesa que apareceu no inicio de 2008 está muito mal cuidada...